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22 de fevereiro de 2025Escrever sobre a história da Polícia Militar de Sergipe é um ato de coragem e responsabilidade, mas escrever sobre aqueles que dedicaram grande parte de suas vidas para preservar os 190 anos dessa importante Corporação é, sobretudo, um ato de reconhecimento e gratidão.
A frase acima foi escrita ainda sob efeito da ansiedade que antecedia o encontro com o coronel Dilson Ferraz, ao longo do percurso entre o Quartel do Comando Geral da Polícia Militar, na região central, e a residência do historiador, na zona de expansão, ambas no município de Aracaju.
Em processo de recuperação, devido a um acidente doméstico que lesionou a sua coluna, o coronel Dilson me recebeu em sua casa, com a mesma cordialidade e receptividade que marcaram seus mais de trinta anos de serviços prestados à Polícia Militar de Sergipe. Por este motivo, a esperada conversa agendada com o guardião do nosso acervo não pôde ser inspirada pelo ambiente histórico do museu, o que certamente não prejudicou em nada o nosso bate-papo. Afinal, naquele momento, eu estava diante da memória viva da PMSE, totalmente disposta a resgatar o passado glorioso da Corporação.
A trajetória do Coronel Dilson na corporação sergipana teve início em 2 de fevereiro de 1989, quando o pernambucano de Recife, oriundo do Exército Brasileiro, ingressou na Polícia Militar de Sergipe. Naquela época, uma Lei Estadual permitia que oficiais das Forças Armadas ingressassem ao Quadro Complementar de Oficias da Polícia Militar (R2).
Já passaram 36 anos desde aquele dia, mas o oficial lembra bem como era o patrulhamento do município de Aracaju. Com apenas duas viaturas, uma direcionada à Zona Norte e outra focada na Zona Sul da capital, os policiais trabalhavam bravamente para garantir a segurança da população.

“Recordo que fazíamos o patrulhamento a bordo de um ‘Chevete’, bem diferente das viaturas atuais, que possuem ar-condicionado e até computador de bordo. Nada de Equipamento de Proteção Individual (EPI). Não utilizávamos coletes, capacetes de aço. Graças a Deus tudo isso foi mudando”, observou.
Exercitando sua ótima memória, o coronel Dilson ainda lembrou do período em que atuou no 2º Batalhão de Polícia Militar (2º BPM), sediado no município de Propriá. Na unidade, ele esteve à frente das companhias dos municípios de Carmópolis e Porto da Folha.
“Era dureza! Praticamente tínhamos que construir a companhia para que pudéssemos morar no local. Para isso, contávamos com a boa vontade dos praças. Curiosamente eu tive que fazer o policiamento em Carmópolis com carroças puxadas por cavalos. Contratamos um carroceiro que vinha pegar os soldados na companhia para levar até o centro da cidade para fazer o policiamento ostensivo. Foi um tempo em que precisávamos fazer experiências e trabalhar de acordo com o que o local oferecia”, recordou.
Diante das inúmeras experiências vivenciadas pelo coronel Dilson na Polícia Militar de Sergipe, o oficial lembra bem como iniciou o seu interesse pelo acervo histórico da instituição.

“Pouco tempo depois de ingressar na Polícia Militar, o que me chamou bastante atenção, dentro do ambiente da Corporação, foram as peças antigas que existiam no antigo prédio do Quartel do Comando Geral”, comentou com um certo saudosismo.
A partir desse interesse pelos acervos, o coronel Dilson começou a averiguar se havia algum tipo de material escrito sobre a história da PMSE. No entanto, em contraste com a curiosidade do oficial, todos os militares consultados informaram que não havia nenhum material escrito sobre os momentos históricos da Corporação, a não ser relatos em boletins internos. Logo, o coronel percebeu que era o momento certo para que ele iniciasse um trabalho baseado nas duas coisas que mais gosta de fazer: pesquisar e escrever. Mesmo repleto de vontade de iniciar a busca histórica, o principal pesquisador da história da PMSE precisou superar alguns obstáculos.
“Quando ingressei na Polícia Militar eu não era historiador. Tinha apenas o curso de geografia concluído na Universidade Católica de Salvador. Por esse motivo, me senti incomodado em escrever algo sobre a história da polícia sem ser um historiador. É como fazer uma cirurgia sem ser médico. Eu temia que desse tudo errado”.
Àqueles que conhecem bem o coronel Dilson sabem que determinação e persistência são atributos que o ajudaram a superar os momentos de dificuldades enfrentados nas diversas unidades em que atuou. E, certamente, não seria esse o motivo que o faria desistir de suas metas. O oficial então não perdeu muito tempo e se matriculou no curso de História da Universidade Tiradentes, como portador de diploma, onde concluiu a graduação de historiador.
“Eu produzi o meu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) com o tema: A Importância do Museu da Polícia Militar de Sergipe. Logo depois, tive a grata surpresa de saber que, a partir da minha pesquisa, muita gente começou a apoiar a restauração do nosso museu.”
Certo de que as salas do antigo QCG já não suportavam mais o número crescente de acervos, coronel Dilson trabalhou incansavelmente para reativar o museu em um local mais adequado. Por coincidência, ou melhor, por persistência do nosso oficial, o imóvel escolhido estava localizado onde toda a história da Polícia Militar teve início, no município de São Cristóvão.
“Nesse período, enquanto passeava pela cidade de São Cristóvão, onde nasceu a Polícia Militar, observei que o prédio da antiga delegacia estava desativado. Rapidamente, procurei o delegado daquele município para saber a quem pertencia o imóvel. Como ele não tinha a informação, procurei o cartório da cidade e, por incrível que pareça, o estabelecimento também não possuía nenhum documento com as devidas informações”, explicou.
Obviamente que o oficial não desistiria na primeira dificuldade e, naquela mesma semana, foi até o órgão governamental responsável, para saber qual a relação do prédio com o Estado. Entre idas e vindas, ele descobriu que existia um contrato de comodato entre a União e o Governo de Sergipe para utilização do imóvel, exclusivamente para fins históricos e culturais.
Diante dessa descoberta, o nosso historiador ficou sem entender o porquê, então, de o imóvel ter funcionado por um bom tempo como uma delegacia de polícia. Para dificultar ainda mais as coisas, na época, o comandante-geral resolveu instalar uma companhia da Polícia Militar no mesmo prédio. Obviamente que a ideia não foi o que o coronel Dilson esperava. Caso isso acontecesse, o prédio corria o risco de ser devolvido para União, pois também feria as normas do contrato firmado anteriormente.
“Como defensor do museu, não iria deixar que isso acontecesse e procurei convencer o comandante-geral a desistir da ideia. Foram várias tentativas, mas, ao fim, conseguimos evitar que o imóvel fosse tomado pela União e continuasse sob a nossa jurisdição.”

Após os esforços e os gestos abnegados do coronel Dilson, finalmente o Museu da Polícia Militar foi estabelecido na Praça São Francisco, na cidade histórica de São Cristóvão. Segundo o historiador, o prédio onde hoje funciona o museu foi construído no século XIX, entre 1825 e 1850, com uma arquitetura que veio para substituir os antigos casarões coloniais da época do Brasil império. O modelo raro herdou traços arquitetônicos da época das invasões espanholas.
O pesquisador explicou que o museu da Polícia Militar de Sergipe nasceu em 14 de novembro de 1969, mas está funcionando na atual sede há cerca de dez anos. Infelizmente, de acordo com ele, antes de ser transferido para a nova sede, o museu não recebia os cuidados adequados, causando a perda de várias peças que faziam parte do acervo.
Por outro lado, entre as principais peças do museu, ainda preservadas, o coronel Dilson destacou o acervo do coronel João Pereira de Oliveira, que inclui uma espada, duas pinturas, duas cigarreiras de prata e um diário escrito por ele com anotações dos eventos militares. Além desse material, o oficial foi responsável pelo resgate e conservação de vários objetos de grande valor histórico, a exemplo de bandeiras, armamentos, certificados e uniformes antigos.
“Quando trouxe alguns fuzis para fazer parte do nosso acervo, deixei todo o material em quarentena, até ter a certeza de que não havia mais contaminação. Isso deve ser feito sempre que recebermos material de fora. A higienização das peças é imprescindível”, aconselhou.
Resgate histórico
O interesse do coronel Dilson pelas pesquisas envolvendo a história da Polícia Militar de Sergipe teve início de maneira inusitada. O pesquisador lembra que pouco tempo depois de ingressar na PMSE conheceu o cabo Ivo, que, na época, atuava no arquivo da Corporação. Sabendo o quanto o oficial era interessado em história, o praça, bastante solícito, perguntou se ele gostaria de ver alguns documentos interessantes que estavam naquele setor. Curiosamente, naquele momento, coronel Dilson estava focado em outras situações e terminou deixando para ver os papéis em outro momento. Anos depois, quando o padre Juarez ingressou como capelão da Polícia Militar, o comandante-geral da época pediu para que o coronel Dilson mostrasse ao sacerdote como funcionava os diversos setores da nossa Polícia Militar. Afinal, o capelão era oriundo de um seminário e não de um quartel.
“Com esse propósito, comecei, juntamente, com o padre Juarez, a visitar todos os setores da Corporação. Quando chegamos ao arquivo, lembrei desses documentos e pedi que o mesmo cabo Ivo me entregasse para uma possível análise do material. Assim que comecei a ler às páginas, escritas com tanto capricho e beleza, fiquei arrepiado. Tratava-se de croquis das progressões das tropas sergipanas e das certidões de óbito dos policiais militares sergipanos que morreram em combate no Estado de São Paulo, durante a Revolução Constitucionalista de 1932”, afirmou.
O coronel Dilson relatou que os documentos seriam incinerados, mas o cabo Ivo, ao perceber o capricho e a beleza da escrita, escondeu o material embaixo do banco da viatura e trouxe de volta para o quartel, evitando a perda de uma parte importante da história da Polícia Militar.

“A atitude do praça foi arriscada, pois diante da ordem superior para incinerar os papéis, ele corria o risco de ser punido por desobediência. Ao mesmo tempo foi uma atitude heroica, tendo em vista que foi a partir desses documentos que consegui produzir uma síntese para escrever sobre a participação do efetivo sergipano na Revolução de 1932”, enfatizou.
Segundo o pesquisador, durante a participação na Revolução Constitucionalista de 1932 houve um grande deslocamento de policiais militares sergipanos para a região sudeste do Brasil, onde aconteceu o conflito. A entrada dos sergipanos na batalha resultou na redução do contingente que atuava em nosso estado.
Assim nasceu a Briosa PMSE: Forjada na bravura e no heroísmo da tropa
De acordo com as extensas pesquisas do coronel Dilson Ferraz, a Polícia Militar de Sergipe nasceu na cidade de São Cristóvão em 1835. O Corpo Policial da Província, como foi denominado na época, possuía 201 integrantes, entre praças e oficiais. Com o passar do tempo, mais precisamente, cinquenta anos após a sua criação, o Corpo Policial foi ampliado para oitocentos integrantes. Neste período, o policiamento era realizado a pé e montado, com a utilização de armamentos de percussão extensa, conhecidos como armas de socar, que levavam cerca de um minuto para serem carregados.

Por ser considerado um estado pequeno, Sergipe mantinha seu efetivo policial com bastante dificuldade. Apesar disso, a Corporação sergipana participou de grandes eventos a nível nacional e internacional, a exemplo da Guerra do Paraguai. Na ocasião, a nossa Força Policial sofreu bastante com a necessidade de enviar alguns de seus integrantes para combater os paraguaios na região Sul do Brasil. O coronel Dilson não afirmou com certeza, mas comentou sobre a possibilidade de nossos policiais militares terem lutado nesse conflito com armas artesanais, para suprir a deficiência de armamentos da Corporação.
Outro conflito marcante em que houve a participação dos nossos policiais foi a segunda Guerra Mundial. Ainda de acordo com as pesquisas do coronel Dilson, durante a guerra, os policiais sergipanos não tiveram participação direta nos campos de batalha na Itália, mas sim, protegendo a costa do nosso país, onde os submarinos alemães haviam destruído navios mercantes brasileiros.
Após cerca de duas horas e meia de conversa com o coronel Dilson Ferraz, percebi que o tempo passa, mas a história permanece. Diante daquela fonte de conhecimento, experiência e memória, tive a certeza de que a Polícia Militar foi e sempre será patrimônio do nosso povo.
Texto: 2º sargento André Oliveira